Levantamento Dark Energy Survey revela a medida mais precisa da estrutura da matéria escura no Universo

03 de agosto de 2017 | LIneA

O novo resultado se compara à precisão das medidas da radiação cósmica de fundo, e sustenta a teoria que a matéria escura e a energia escura compõem a maior parte do cosmos

Imagine plantar uma única semente e, com grande precisão, ser capaz de prever a altura exata da árvore que irá crescer dela. Agora imagine viajar para o futuro e ter uma prova fotográfica de que você estava certo. Pense na semente como o Universo infante e na árvore sendo Universo hoje e você terá uma noção do feito que os cientistas que participam da colaboração internacional Dark Energy Survey (DES) acabaram de realizar. Em uma apresentação hoje no encontro da Divisão de Partículas e Campos da Sociedade Americana de Física (APS), que está sendo realizada no Fermi National Accelerator Laboratory, conhecido como Fermilab, localizado perto de Chicago e financiado pelo Departamento de Energia (DOE) dos Estados Unidos, cientistas do DES vão revelar as medidas mais precisas já realizadas da estrutura de grande escala do Universo atual.

Essas medidas de quantidade e do grau de aglomeração (ou distribuição) da matéria escura no cosmos atual foram feitas com uma precisão que, pela primeira vez, rivaliza com as inferências do Universo infante feitas pelo satélite Planck da Agência Espacial Europeia. O novos resultados do DES (a árvore na metáfora acima) está perto de “previsões” feitas a partir das medidas realizadas pelo satélite Planck de um passado distante (a semente), permitindo que cientistas entendam mais sobre de que forma o Universo evoluiu ao longo de 14 bilhões de anos.

LIneA e INCT do e-Universo apoiam a participação de brasileiros neste levantamento através do consórcio DES-Brazil, que além de desenvolver um portal terciário do projeto DES para distribuir dados para o Brasil e outros países, é responsável pela implementação de um Portal Científico para a colaboração que permite análise de dados coletados e simulados. Cientistas do DES-Brazil colaboraram ativamente na obtenção dos resultados apresentados. Participam do DES-Brazil cientistas das seguintes instituições: Observatório Nacional, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Universidade Estadual Paulista, Universidade Estadual de Campinas, Universidade de São Paulo, e Universidade Federal do Rio de Janeiro.

“Esta é uma oportunidade excelente de astrônomos e físicos do Brasil participarem de um projeto desta envergadura, produzindo resultados científicos de impacto”, comenta Luiz Nicolaci da Costa coordenador do LIneA. O vice-coordenador do INCT do e-Universo, Rogerio Rosenfeld, ressalta a importância da participação de cientistas do Brasil: “Um dos levantamentos internacionais contemplados pelo nosso INCT é justamente o DES, onde apoiamos a participação de pesquisadores brasileiros”.

“Este resultado é mais do que excitante”, disse Scott Dodelson, do Fermilab, um dos principais cientistas envolvidos no resultado. “Pela primeira vez, podemos ver a estrutura atual do universo com a mesma clareza que podemos ver em sua infância, e podemos seguir os passos de um para o outro, confirmando muitas previsões ao longo do caminho”.

De maneira notável, este resultado suporta a teoria de que 26% do universo estão na forma de uma matéria escura misteriosa e que o espaço é preenchido com uma energia escura igualmente invisível, que está causando a expansão acelerada do universo agregando outros 70%.

Paradoxalmente, é mais fácil medir a distribuição em grande escala do Universo no passado distante do que medir atualmente. Nos primeiros 400.000 anos após o Big Bang, o Universo foi preenchido com um gás incandescente, da qual a luz sobrevive até hoje. O mapa feito pelo satélite Planck desta radiação de fundo cósmica em micro-ondas nos dá um rápido registro do Universo em seu início, no passado distante. Desde então, a gravidade da matéria escura concentrou a massa e fez o Universo se tornar mais “encaroçado” (menos homogêneo) ao longo do tempo. Mas a energia escura tem lutado contra essa tendência, afastando a matéria. Usando o mapa do Planck como um começo, os cosmólogos podem calcular com precisão como essa batalha se desenvolve ao longo de mais de 14 bilhões de anos.

“As medidas do DES, quando comparadas com o mapa do Planck, suportam a versão mais simples da teoria da matéria escura e energia escura”, disse Joe Zuntz, da Universidade de Edimburgo, que trabalhou na análise. “No momento em que percebemos que nossa medida correspondia ao resultado da Planck dentro de um intervalo de 7%, era emocionante para toda a colaboração”.

O principal instrumento para DES é a chamada câmera de energia escura de 570 megapixels, uma das mais poderosas em funcionamento, capaz de capturar imagens digitais de luz a partir de galáxias a oito bilhões de anos-luz da Terra. A câmera foi construída e testada no Fermilab, principal laboratório do Dark Energy Survey, e está montada no telescópio Blanco de 4 metros da National Science Foundation, parte do Observatório Interamericano do Cerro Tololo no Chile, uma divisão do Observatório Nacional de Astronomia Óptica. Os dados DES são processados no National Center for Supercomputing Applications, na Universidade de Illinois, em Urbana-Champaign.

Cientistas do DES estão usando a câmera, ao longo de cinco anos, para mapear um oitavo do céu em detalhes sem precedentes. O quinto ano de observação tem início neste mês de agosto. Os novos resultados divulgados hoje trazem apenas os dados coletados durante o primeiro ano da pesquisa, que cobre um trigésimo do céu.

“É incrível que a equipe tenha conseguido atingir essa precisão apenas no primeiro ano de sua pesquisa”, disse Nigel Sharp, Diretor de Programa da National Science Foundation (NSF). “Agora que as técnicas de análise foram desenvolvidas e testadas, aguardamos ansiosamente a antecipação dos resultados inovadores à medida que a pesquisa continua”.

Os cientistas do DES usaram dois métodos para medir a matéria escura. Primeiro, criaram mapas de posições galáticas como traçadores e, em segundo lugar, mediram precisamente as formas de 26 milhões de galáxias para mapear diretamente os padrões de matéria escura em bilhões de anos-luz, usando uma técnica chamada lenteamento gravitacional fraco. Para realizar essas medidas ultra precisas, a equipe DES desenvolveu novas maneiras de detectar pequenas distorções nas imagens de galáxias, um efeito que não é visível ao olho, permitindo avanços revolucionários na compreensão desses sinais cósmicos. No processo, criaram o maior guia para detectar a matéria escura no cosmos já desenhado (ver imagem). O novo mapa de matéria escura é dez vezes o tamanho do que o DES lançou em 2015 e, no futuro breve, será três vezes maior do que o atual.

Mapa completo de matéria do primeiro de observações do DES, atualmente o maior guia para detectar a matéria escura no cosmos já desenhado. Crédito: Dark Energy Survey

“É um enorme esforço de equipe e o culminar de anos de trabalho focado”, disse Erin Sheldon, físico do Laboratório Nacional Brookhaven do DOE, que co-desenvolveu o novo método para detectar distorções de lenteamento fraco.

Esses resultados e outros do primeiro ano do Dark Energy Survey serão divulgados ainda hoje no portal, e também durante uma palestra de Daniel Gruen, um NASA Einstein Fellow no Instituto Kavli de Astrofísica de Partículas e Cosmologia no Stanford Linear Accelerator Laboratory (SLAC) do DOE, às 19 horas (horário de Brasília). A palestra faz parte da reunião da Divisão de Partículas e Campos da APS no Fermilab e será transmitido ao vivo em: http://vms.fnal.gov/asset/livevideo.

“O Dark Energy Survey já entregou algumas descobertas e medidas notáveis, e eles mal arranharam a superfície de seus dados”, disse o diretor de Fermilab, Nigel Lockyer. “Os resultados mundiais de hoje indicam grandes passos que o DES irá fazer para entender a energia escura nos próximos anos”.

Para mais informações contacte: Luiz Nicolaci da Costa (ldacosta@linea.org.br) ou Rogerio Rosenfeld (rosenfel@ift.unesp.br) ou Marcio Maia (maia@linea.org.br)

Links: DES-Brazil e Dark Energy Survey

Dark Energy Survey é uma colaboração de mais de 400 cientistas de 26 instituições em sete países. O financiamento para o Projetos DES foi fornecido pelo Escritório de Ciências do Departamento de Energia dos EUA, Fundação Nacional de Ciência dos EUA, Ministério da Ciência e Educação da Espanha, Conselho de Instalações de Ciência e Tecnologia do Reino Unido, Conselho de Financiamento do Ensino Superior para Inglaterra, ETH Zurique Para a Suíça, Centro Nacional de Aplicações de Supercomputação da Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, Instituto Kavli de Física Cosmológica da Universidade de Chicago, Centro de Cosmologia e Física Astro-Partícula da Universidade Estadual de Ohio, Instituto Mitchell de Física Fundamental e Astronomia em Universidade do Texas A & M, Financiadora de Estudos e Projetos, Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e Ministério da Ciência e Tecnologia, Deutsche Forschungsgemeinschaft e as instituições colaboradoras Pesquisa de Energia Escura, a lista dos quais pode ser encontrada no link da Colaboração DES.

3 comentários para “Levantamento Dark Energy Survey revela a medida mais precisa da estrutura da matéria escura no Universo”

  1. Calorosos parabéns a todos, com ênfase na equipe brasileira, onde os esforços devem se multiplicar ao limite do sacrifício 7ndividual para obter resultados!

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