A dança dos ventos galácticos

17 de abril de 2019 | LIneA

A captura de matéria por buracos negros supermassivos (de um milhão a 10 bilhões vezes mais massivos que o Sol) localizados no centro da maioria das galáxias, resulta em uma grande quantidade de emissão de energia. Na maioria das galáxias, o buraco negro central não está ativamente capturando matéria, mas em galáxias com material disponível em suas redondezas, o processo de aumento de massa resulta na produção de radiação e ventos emanados do disco que se forma no entorno do buraco negro.

Estes objetos são conhecidos como núcleos ativos de galáxias. Há pouco tempo, acreditava-se que somente os núcleos ativos mais poderosos eram capazes de produzir ventos em escalas galácticas (cerca de 25 mil anos-luz), porém um estudo realizado em 2016 utilizando dados do projeto Mapping Nearby Galaxies at APO (MaNGA) revelou uma população de galáxias que hospedam núcleos ativos de baixa luminosidade capazes de produzir ventos galácticos. Estes ventos parecem ser responsáveis por impedir a formação de novas estrelas, afetando assim, a evolução das galáxias. A esta classe de galáxias foi dada o nome de Red Geysers, em alusão aos ventos emanados do núcleo e a cor avermelhada de populações estelares velhas, que dominam a emissão de radiação.

Um estudo liderado por Rogemar Riffel (UFSM) e outros afiliados ao LIneA, em colaboração com pesquisadores da USP e instituições internacionais, revelou uma característica inusitada das Red Geysers. O estudo, publicado em abril na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, utilizou dados do levantamento MaNGA em conjunto com observações obtidas com o Telescópio Gemini Norte (Figura 1) da galáxia Akira, protótipo da classe de Red Geysers. Este estudo possibilitou a análise detalhada da cinemática e excitação do gás na região central desta galáxia, próximo do buraco negro supermassivo.

 

Figura 1 – Telescópio Gemini Norte. Créditos da imagem: Observatório Gemini.
Figura 2 – Emissão e velocidade do gás na galáxia Akira, observado com o MaNGA (esquerda) e Gemini (direita). Os mapas de cima mostram a largura equivalente (EqW) da linha Halpha do átomo de hidrogênio, utilizado para traçar a emissão do gás. As barras de cores indicam os valores de EqW em Angstrons. Os painéis inferiores mostram os campos de velocidades, com as barras de cores indicando as velocidades em km/s. Regiões em vermelho indicam que o gás está se afastando de nós e regiões em azul representam o gás se aproximando. Os círculos pretos mostram que a direção do vento varia com a distância ao núcleo da galáxia e que esta variação está associada a uma maior emissão do gás. Nas figuras, 1 arcsec corresponde a cerca de 1600 anos-luz. Créditos da imagem: Créditos: R. A. Riffel.

Os pesquisadores descobriram que além de se estender em escalas galácticas, a orientação do “vento” varia com a distância ao centro da galáxia (Figura 2). A explicação mais provável para este fenômeno é que ele se deva à precessão do disco de acreção que circunda o buraco negro supermassivo no centro de Akira (Figura 3). Embora jatos relativísticos associados a discos de acreção precessionantes sejam comumente reportados na literatura, o trabalho realizado por afiliados do LIneA representa a primeira detecção de ventos sub-relativísticos (velocidades de poucas centenas de quilômetros por segundo). Considerando que estes ventos possuem um ângulo de abertura maior do que os jatos relativísticos, eles conseguem atingir um volume maior da galáxia, e possivelmente impedir que novas estrelas sejam formadas.

Figura 3 – Concepção artística de ventos produzidos no disco de acreção em núcleos ativos de galáxias: Créditos da imagem: ESA/AOES Medialab.

Entender o efeito dos ventos emanados por núcleos ativos nas galáxias que os hospedam é crucial para entender como as galáxias se formam e evoluem, e o trabalho liderado pela equipe brasileira representa uma importante peça neste quebra-cabeça. A equipe pretende realizar trabalhos semelhantes para outras Red Geysers, a fim de verificar a presença de ventos originados pelo crescimento do disco de acreção. Mais detalhes sobre o estudo podem ser encontrados no artigo publicado.

O LIneA é um laboratório apoiado pelo Observatório Nacional (ON), Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), e pela Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), que tem como missão dar suporte a participantes de grandes levantamentos como o MaNGA, além de ter a finalidade de apoiar a participação brasileira em levantamentos astronômicos.

Deixe um comentário